Este foi o segundo ano da 42formas no SXSW Interactive e no SXSWedu. Para quem não conhece, o SXSW é uma conferência que acontece em março em Austin, no Texas, desde 1986. Começou como um festival de música e expandiu para cinema e interatividade. São dez dias para cinema, cinco para interatividade e cinco para música. A cidade, que é uma jóia progressista no meio do Texas, se transforma pra esse período. Então, além das atividades no centro de convenções, vários hotéis recebem painéis e várias empresas utilizam espaços ao redor para fazer suas ativações: tem a casa da IBM, da Amazon, Panasonic, McDonald’s, Dell etc. Uma semana antes, acontece o SXSWedu, um desdobramento do festival principal e focado em educação pública e básica.
Este segundo ano serviu para comprovar a minha teoria de que cada pessoa faz o seu SXSW. Afinal, são várias painéis e palestras acontecendo a mesmo tempo, mais os estandes, ativações diversas e os inúmeros momentos para conhecer gente nova. Claro, alguns temas são recorrentes e o Bruno Milagres, amigo de longa data, fez uma boa análise de alguns desses temas para o canal da Ciatech no YouTube: chatbots, vídeos online e mudança no conceito de carreira.
Ao longo dos próximos dias, eu e o Marcos vamos colocar as nossas impressões aqui no blog, começando por hoje. E há uma vantagem em poder participar dos dois eventos, que é ver como alguns temas e discussões são transversais aos SXSWs. E depois de duas ou três palestras sobre assuntos completamente diferentes, você consegue fechar os pensamentos na sua cabeça.
Vamos lá?
O conteúdo centrado no usuário
Uma dos assuntos discutidos no SXSWedu e no SXSW Interactive a questão do conteúdo centrado no usuário. Aqui, poderíamos falar sobre “design centrado no usuário” ou “aprendizagem centrada no aluno”, mas a usaremos “conteúdo” porque ele é mais amplo e abrange as duas conferências. Na primeira keynote do SXSWedu, o professor Chris Emdin utilizou o último disco da banda A Tribe Called Quest, ““We got it from Here… Thank You 4 Your service”” como uma analogia para falar sobre o estado atual da educação. Para ele, “a educação é essencialmente os problemas dos direitos civis da nossa época. Nosso trabalho não é sobre educar, mas tudo junto“.
Emdin reforça o argumento de que tudo o que foi feito na educação até agora, principalmente para as minorias e os marginalizados, não foi suficiente. Por isso, “a gente segue daqui, obrigado pelo trabalho“. Para ele, o contexto onde negros e pardos são inseridos não foi construído para eles. Como não conseguem ter bom desempenho escolar por não se sentirem conectados, acabam saindo da escola. “Quando um aluno não se sente parte daquele ambiente, ele vai abrir um novo espaço para sentir-se parte e vai demonstrar sua inteligência lá.”
Então aquele aluno que odeia aula de línguas e não se dedica é taxado de incapaz pelo professor. Mas, esse mesmo aluno acha seu espaço na cultura do hip-hop e começa a produzir letras maravilhosas, fazendo um uso mágico da língua. (Aliás, já viram esse vídeo maravilhoso do Vox sobre as letras de rap?) O mesmo serve para um menino que faz grafite no décimo andar de um prédio. Ele com certeza sabe muito sobre física e química.
E muitas vezes a gente vê esse problema no nosso dia-a-dia, quando desenvolvemos um conteúdo ou um objeto de aprendizagem, que mesmo feito na melhor das intenções, não conversa com seu público porque não foi feito pensando nas necessidades dele, mas sim nas que achamos que eles tinham.
Esse tema foi recorrente, por incrível que pareça, no workshop da Crave, que é uma empresa que desenvolve brinquedos sexuais de luxo. Ti Chang e Michael Topovolac, dois designers industriais, estão à frente da equipe e contaram que os produtos da empresa saíram de conversas sobre o dia-a-dia das suas clientes e o que elas queriam deste produto: hábitos, costumes, onde gostam de ir para se divertir e afins. Observem, nada relacionado à vida sexual delas, mas que convergiu para um produto feito para elas. Um dos exemplos é o Velvet, um brinquedo em formato de pingente.
Finalmente, em uma palestra que caí de para-quedas – e isso é uma das maravilhas do SXSW – foi o painel “Creative Headspace for a BeBop Century”, com Michael Hendrix, sócio da IDEO, e Panos Panay, do Berklee College of Music Institute for Creative Entrepreneurship. Os dois falaram da similaridade entre o trabalho dos designers e dos músicos, por exemplo, ter a percepção do que ocorre ao nosso redor.
Michael reforçou que o processo de design é baseado em observação. O bom designer consegue ser um bom observador e, a partir daí, ele desenha as soluções. Um dos clientes da IDEO, por exemplo, não entendia a razão na queda das vendas do seu medicamento para artrose. Podia ser a embalagem, a bula, mas não sabiam. Então, a IDEO começou a observar o cotidiano de uma das pacientes, cuja doença estava progredindo. Perguntaram como ela abria a embalagem do medicamento e ela então usou um fatiador de pão para cortar a tampa, já que não conseguia mais abrir do modo convencional.
Observem que o processo de criação também é similar às diversas atividades. Inspiração, idealização e execução partem de um ponto, são totalmente estressadas até os conceitos se fecharem novamente e chegarmos o produto final.
Ou seja, é interessante pensarmos no conteúdo centrado no usuário e nesses processos de criação quando estamos falando de soluções aderentes, onde o público-alvo sinta-se parte desta solução e interessado em utilizá-la. Isso é muito mais do que soluções inovadoras ou tecnológicas. É partir para o simples.
Como próprio Chris Emdin fala, “a tecnologia não é nada se você não tiver pedagogia“. Ou, no caso da educação corporativa, a andragogia.
—
Gostaríamos de ouvir seus comentários e sugestões sobre o assunto. E participe da conversa assinando a nossa newsletter.
Até a próxima!